quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

ESTADO DE SÍTIO





















ESTADO DE SÍTIO

*Ricardo Lacava Bailone

-Conto vencedor do XII Concurso Contos do Tijuco "Eliane Gouveia"


                       No meu buraco me sitio, no leito vazio de meu rio, no meu buraco cândido e vazio, vazio de seres corrosivos e sombrios. O pânico que habita as almas, no mundo lá fora que sinto, retiro-me de forma branda, para ser olvidado no limbo. Enquanto buscas lá fora, satisfação improvável, permita-me que vos diga, amigo, o ego é insaciável. A felicidade está aqui, antes que me esqueça, não no material, mas no interior da cabeça. Quando a flor nasce, já começa a morrer, não deixes que a vida passe, e não volte a dizer. Refugie-se no bem, e o bem alheio lhe tornará, reclusos um ao outro, a parede se erguerá. E foi assim que tentei minha reclusão deste estúpido mundo que pairava sobre meus ombros. Revoltado pacifista assíduo desde os meus catorze anos, colecionava pôsteres de meus ídolos nas paredes de meu cubículo. Minha mãe sempre olhava com ares suspeitos, embora eu soubesse que ela apenas não gostasse que pregasse nada na parede recém-pintada, batalhada com o suor árduo da labuta diária. Deixava-me levar pela luta daqueles que não pensavam somente em si, e assim, aos dezessete anos comecei a engrenar no sistema que girava em torno das críticas desse modo de governo iníquo e desleal, o qual a engrenagem jogava os lucros apenas para um lado da balança. 

Personificava meu estereótipo. Bermudas longas, corrente pendurada no pescoço, boné virado para trás, óculos escuros de um de meus ícones, John Lennon, e sempre uma camisa com uma mensagem subliminar aos opulentos defensores desta egocracia. Possuía meu clã. Clã de animais periféricos, com ideias diferenciadas. E enfatizo que foi na diferença que nasceram as maiores evoluções. Concepções tidas como inaceitáveis e inexequíveis. A normalidade consensual confrontava-se com a normalidade instintiva. Estava farto de tanta exploração, tantas notícias falaciosas, tantas cabeças ignorantes e de má fé. Nas mãos de caranguejos, lamacentos animais coniventes. Corporativistas na malevolência e na divisão dos pró-labores. Pessoas como estas que deixavam o país neste instável e corroído leito que se encontrava, e estas mesmas, ainda tinham a insanidade mental de culpar o mísero funcionário que não pusera as gotas de adoçante em seu café a gosto. 

Inconcluso com os resultados, resolvi que a solução seria minha reclusão. Mas os tempos eram sombrios. Não podíamos nos esconder como anelídeos e assistir tudo cegamente debaixo da terra. Assinavam papéis na calada da noite. Articulavam o executivo, legislativo e judiciário. Escrachavam mentiras na mídia para corromper a ignorante massa – e a débil elite. Retiravam direitos do povo e crucificavam-nos aos próprios interesses. Via meu pai na azáfama feito roda de água para manter o modesto, mas digno lar. Não só ele, mas eu também contribuía. Trabalhava meio período ajudando-o em sua mecânica de automóveis, no puxadinho de minha casa. Na escola, gastava o resto do tempo, entre paqueras, camaradagem e um pouco de estudo. 

Assim, após dois meses olvidados em minha casa, o telefone tocou. Vesti aquela peita onde nas costas a letra maiúscula “A” sobrepunha-se a “O”. Anarquia e Ordem. Saí para clamar minha independência. A juventude ainda tinha a vida pela frente. Minha testosterona clamava pela vivacidade, além do que minha menina estaria lá. As ruas estavam cheias, a multidão aglomerava-se cada vez mais. Gritos de ordem, baterias, vontade de mudança. Consolidava minhas ideias com as alheias, tornando aquela presença ainda maior. Um espetáculo humano. Pensei, ainda existe esperança! Vi de longe minha garota. Mesmas roupas, mesmos estilos. Também bravejava palavras de ordem, como eu. Fui me aproximando, mas o barulho era ensurdecedor, e o anelo pela metamorfose social e coletiva, demasiado. Uns empurravam os outros, o espaço estava cada vez mais exíguo. Ela olhou para mim. Sorriu. Nos fitamos por um momento. Fui empurrado fortemente contra um poste, e quando me dei por si, ela já não estava mais ali. O desespero se acentuou. Pânico nos olhares. Sem medo e sem dó. A ordem estava dada. Já não mais a via. Todos corriam. E eu decidi fazer o mesmo, procurando um lugar seguro. 

Barricada, tiros de bala de borracha, gás lacrimogêneo, repórteres correndo em busca das melhores imagens, sujeitas à censura e cortes no horário nobre, socos, pontapés, spray de pimenta, bofetada na orelha, zumbido, imagens espaçadas, escuridão. Um espetáculo desumano. Disseram que tem alguém desmaiado. Muito sangue corre pelo chão. Parece que ignoram aquele corpo estendido na superfície. Não obstante, alguns protestantes arriscam-se em carregá-lo em busca de ajuda. 

Fatos que só tomei por mim nos noticiários da nauseante mídia já descrita por Orwell, com informações completamente inverossímeis. No hospital, olvidado por três meses, recebi algumas visitas, que me viam como um sobrevivente guerreiro. Um baderneiro e irresponsável para os ignóbeis e chulos, que brincam com a vida alheia, sem perceberem que a existência será lépida para todos. O zumbido ainda me acompanha, juntamente com a solidão. Agora, ao protesto, assisto sentado em uma cadeira de rodas. Recuperando-me de um trauma ainda não curado. Início do ano recebi a notícia de que havia passado no curso de odontologia em uma boa universidade pública, sonho de minha mãe. Mas penso em não me matricular. Ainda estou muito vulnerável a todas estas mudanças repentinas. Sei que sairei desta, pois sou um pugilista nato, embora por si só, sem nunca ter tido apoio do Estado. Neste regime fechado não me calarei, frente a esta condução cega e indirigível, assim como muitos outros, fui, sou e serei, apenas mais um combatente invisível. 

                   Apenas mais um injustiçado no mundo.



*Ricardo Lacava Bailone
Médico veterinário graduado pela Universidade Estadual Paulista, mestrado pela Universidade Federal de Santa Catarina e Doutorado pela Universidade Estadual Paulista e Harper Adams University (Sanduíche Reino Unido). Servidor Público Federal do Ministério da Agricultura, membro da International Society of Applied Ethology, possui vários artigos científicos publicados em periódicos conceituados nacionais e internacionais de sua área de atuação. Mais de vinte participações em antologias com classificações e menções honrosas. Vencedor do XIV Prêmio Literário Livraria Asabeça 2015 com a obra "O canto do Urutau (A lenda da mãe-da-lua)". publicada na 24ªBienal Internacional do Livro de São Paulo em 2016.

- (Agora, também, vencedor do XII Concurso Contos do Tijuco 2017) 












sábado, 2 de dezembro de 2017

RESULTADO XII CONCURSO CONTOS DO TIJUCO

A L A M I
Academia de Letras, Artes e Música de Ituiutaba
e
Fundação Cultural de Ituiutaba

XII CONCURSO CONTOS DO TIJUCO
ELIANE GOUVEIA”
2017



Foto: Eliane Gouveia











Resultado:

Conto vencedor -

" Estado de sítio"
Ricardo Lacave Bailone
São Carlos – SP
       
          ***
Classificados: (ordem aleatória)

1- "O livreiro"
André Telucazo Kondo
Caraguatatuba – SP

2- “Oi, catraca! Você se lembra de mim?”
João Paulo Lopes de Meira Hergesel
Alumínio - SP.

3-" Sobretudo, amor. Mesmo assim; ou até por isso.”
Jacob Blumen Goldemberg
Rio de Janeiro - RJ.

4- " Mirena, hoje está tão seco".
Betzaida Mata Machado Tavares
Belo Horizonte – MG


5- “Dois em um bar”.
Nilson de Carvalho Lattari
Juiz de Fora - MG

6- “Palavras cruzadas não mentem”.
Celso Antonio Lopes da Silva
São Paulo – SP

7- “Nenhum amanhã será tão lindo como hoje
Edileuza Bezerra de Lima Longo
São Paulo - SP.

8- “Uma noite entre os mortos
Roque Aloísio Weschenfelder
Santa Rosa – RS

9- “À beira do abismo
João Lisboa Cotta
Ponte Nova - MG


Nossos agradecimentos à esta Comissão Julgadora pelo seu voluntário e esplêndido trabalho. Com vinte contos - o supra sumo do concurso - nas mãos, foram horas a fio até conseguir separar o conto vencedor. Fechado o círculo, fica, então, a nossa gratidão aos membros desta Comissão.     

COMISSÃO JULGADORA

XII CONCURSO CONTOS DO TIJUCO - 2017
“ELIANE GOUVEIA”

- Sandra Lúcia Modesto –
Pós-graduada em Educação - FEIT/UEMG
Graduada em Letras- (Português/Inglês) - FEIT/UEMG
Coordenadora do projeto: Oficina literária para a terceira idade.
Escritora.

- Francisco Ângelo de Freitas “Chico Ângelo”
Formado em Letras – FEIT/ UEMG; Professor; Escritor

- Geórgia Maria Finholdt Ribeiro
Formada em Letras com Pós Graduação em Direito Educacional
Analista da Educação



sexta-feira, 10 de novembro de 2017

XII Concurso Contos do Tijuco inscrições encerradas




O último conto inscrito! 

Inscrições encerradas com o maior número de participantes. São centenas de escritores, de todas as partes do país e até alguns do exterior como: Portugal, Japão e França. 

Agora a Comissão Organizadora vai arregaçar as mangas, separar os melhores e entregar para a Comissão Julgadora. Logo logo conheceremos o vencedor do antológico XII Concurso Contos do Tijuco "Eliane Gouveia" 

O alto número de inscritos confirma a confiança que os escritores tem na capacidade da ALAMI para organizar concursos.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

XII CONCURSO CONTOS DO TIJUCO "ELIANE GOUVEIA"



ALAMI
Academia de Letras, Artes e Música de Ituiutaba
Ano de Fundação 1.996
alami.xpg.com.br 
alamiacademia@yahoo.com.br 
e
Fundação Cultural de Ituiutaba
promovem



          XII Concurso Contos do Tijuco
             "ELIANE GOUVEIA”

.Regulamento

1 – A Fundação Cultural de Ituiutaba e a Academia de Letras, Artes e Música de Ituiutaba – ALAMI – promovem em parceria o XII Concurso Contos do Tijuco, uma atividade de caráter literário e cultural sem fins lucrativos, que nessa edição homenageia a escritora Eliane Gouveia – biografia da homenageada na parte final deste regulamento -.  

2 – Poderão inscrever-se escritores de qualquer nacionalidade (desde que o conto seja escrito na língua portuguesa). A inscrição implica na concordância automática com todas as cláusulas desse regulamento.

3 – O conto deverá ser escrito em língua portuguesa, inédito, apresentado em quatro vias digitadas em corpo 12. Cada participante poderá inscrever apenas um conto, sem limite de páginas e sem restrição quanto à forma e ao conteúdo. O concorrente é único e inteiramente responsável por garantir que seu conto seja inédito, sendo responsável, civil e criminalmente, em caso de plágio. 

4 – O conto deverá ser enviado em um envelope grande e lacrado, identificado na frente com o nome do concurso. Dentro deste envelope os concorrentes deverão enviar um envelope menor, também lacrado, identificado na parte externa apenas com o título do conto e o pseudônimo utilizado, este envelope menor deverá conter uma folha escrita com os seguintes dados: - nome do conto e pseudônimo, nome completo do autor, endereço, e-mail, telefone para contato e pequena biografia. 

5 – O prazo para a inscrição termina, impreterivelmente, no dia 31 de outubro de 2017, valendo a data do carimbo do correio. Enviar a inscrição para o seguinte endereço:

ALAMI – Academia de Letras, Artes e Música de Ituiutaba –.
Avenida Três, entre Ruas 18 e 20 nº 240 – Casa da Cultura -
Ituiutaba –MG – CEP 38300.160.



6 – Os contos serão avaliados pela COMISSÃO ORGANIZADORA e os melhores, em número de 20, serão entregues à COMISSÃO JULGADORA, que elegerá o conto ganhador.

6/1- A COMISSÃO JULGADORA será formada por três membros de notória competência na matéria, não pertencentes a ALAMI e a Fundação Cultural de Ituiutaba.

7 – O autor do conto ganhador receberá como prêmio a quantia de
R$1. OOO, 00 (um mil reais) –, importância da qual, em conformidade com a lei, será retido o percentual do Imposto de Renda, valor este patrocinado pela Fundação Cultural de Ituiutaba -, Certificado de Menção Honrosa e livros da biblioteca da ALAMI.  
  
8 – O conto premiado será publicado no blog da ALAMI – www.solardaliteratura.blogspot.com.br -  e outros sites literários que prestam serviços de divulgação de concursos de contos.

*8/1 - A Comissão Julgadora selecionará mais nove contos, sem ordem de classificação, para receberem “Certificado de Menção Honrosa” e, para possível publicação em livro.  

9 – O resultado do concurso sairá numa data bem próxima do dia 14 de dezembro de 2017 ou, imediatamente ao término dos trabalhos da Comissão Julgadora.

*9/1 - O resultado do concurso será divulgado no blog: www.solardaliteratura.blogspot.com.br – e outros sites literários que colaboram com a Fundação Cultural de Ituiutaba e a ALAMI na divulgação de concursos de contos.

10 – A entrega do prêmio ao ganhador do Concurso e a entrega do “Certificado de Menção Honrosa” aos autores dos contos selecionados, será em data a ser informada. - pelo telefone ou e-mail –

*10/1- O autor de um conto selecionado que não comparecer à Cerimônia de Premiação, receberá o Certificado por meio eletrônico. 
     
11 – Poderá a Comissão Julgadora deixar de outorgar o prêmio se avaliar que a ele nenhum dos contos faz jus.

*11/ 1 - Não haverá devolução dos contos recebidos, que serão incinerados logo após o julgamento.   

12 – Poderá a Fundação Cultural de Ituiutaba publicar um livro com o conto vencedor e os nove contos selecionados pela Comissão Julgadora. 


13 – As decisões da Comissão Julgadora são irrecorríveis.

14 – Os casos omissos neste regulamento serão resolvidos pela ALAMI e Fundação Cultural de Ituiutaba

Ituiutaba, 12 de Junho de 2017

Comissão Organizadora:

Regina de Souza Marques Almeida - Coordenadora de Concursos- ALAMI

Membros:
Jaderson Agostinho – Fundação Cultural de Ituiutaba
Sonone Luiz Vilela Junqueira - ALAMI
Adelaide Pajuaba Nehme - ALAMI
José Maria Franco de Assis - ALAMI
Enio Eustáquio Ferreira - ALAMI




BIOGRAFIA DA ESCRITORA ELIANE GOUVEIA

Eliane Franco Guimarães Gouveia nasceu em Ituiutaba, Minas Gerais, no dia 29 de Março de 1956. Filha do Ex-Combatente da Segunda Guerra Mundial, Abílio Moura Guimarães e de Teresa Franco Guimarães.Aos cinco anos de idade inicia seus estudos e cursa o Pré-primário e o Primeiro ano com sua tia Candinha, em casa. No Segundo ano primário é matriculada no Colégio e Escola Normal Santa Teresa onde conclui o Primário. Transfere-se para o Instituto Marden para cursar o Quinto ano ou Admissão ao Ginásio. Retorna para o Colégio Santa Teresa e conclui o Ginásio. Muda-se então para a Capital Mineira e cursa os dois primeiros anos do Científico no Colégio Estadual Central Governador Milton Campos.
Não suportando a saudade de casa, em 1973 retorna à terra natal onde conclui o segundo grau no Colégio Estadual Governador Israel Pinheiro.
No ano seguinte começa a trabalhar no extinto Banco Comércio e Indústria de São Paulo,e presta vestibular e é aprovada para o curso de letras na FAFI – Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ituiutaba. No final deste mesmo ano presta concurso e é aprovada para o cargo de Escriturária no Banco do Brasil, onde fez cursos de Contabilidade e Caixa Executivo entre outros, e onde conheceu e fez amizade com o Professor Doutor Benedito Santana que lhe apresentou a obra da grande poetisa mineira Adélia Prado. Não conseguindo conciliar os estudos com o trabalho acabou trancando a matrícula do curso de Letras.
Em Abril de 1978 casa-se com o Engenheiro Agrônomo José de Gouveia Vilela Filho e se muda para a cidade de Capinópolis onde reside por seis anos, época em que nasceram seus filhos Haroldo (1979) e Olívia (1981).
Em Capinópolis foi Editora e Redatora -Chefe do jornal Reunir Gente, periódico de publicação mensal dos funcionários do Banco do Brasil.
Em Janeiro de 1984 volta à Ituiutaba, dá à luz ao seu filho caçula Diogo, pede licença do Banco e se muda para a fazenda do Bugre no município de Prata (MG).
Em 1987 retorna à cidade de Ituiutaba e ao corpo de funcionários do Banco onde permanece até 1994. Com a morte de seu sogro José de Gouveia Vilela, afasta-se definitivamente do emprego no banco e retorna à fazenda do Bugre onde vive até o ano de 2008, no lugar denominado Furna do Rola Macaco.
Foram anos profícuos onde a autora viveu, vivenciou, criou, inventou, imaginou e se inspirou a escrever grande parte da sua obra literária, e época em que participou junto com outros escritores, de três Antologias Poéticas de poetas de Ituiutaba.
Em 2004 por sugestão do seu primo Eugênio Franco, foi convidada para participar da ALAMI – Academia de Letras Artes e Música de Ituiutaba, onde ingressou na condição de membro fundador, Cadeira de número 25, seu patrono é o Jornalista e historiador João Petráglia.
Em 2005 foi vencedora do "II Concurso Contos do Tijuco” com a obra “DOUTOR HONORIS CAUSA”.
Em 2007, em parceria com a escritora Mena Vilela, lança seu primeiro livro intitulado: “POEMAS A QUATRO MÃOS”.
Em 2010 recebeu o prêmio “Mérito Cultural - Poesia do Ano” para o poema “PESCARIA”.
Em 2011 recebeu o prêmio “Mérito Literário – Livro do Ano” pela edição do seu livro “A DONA DO CAMPO”, lançado em 2010.
Em 2014 lançou o livro de poemas A SENSITIVA, juntamente com o livro infantil “A COLÔNIA DE FÉRIAS”.
E em 2017 estréia em prosa com seu livro “CASOS DE ALICINHA, ANEDOTAS E OUTRAS LOROTAS” e o livro infantil “CASOS DE CRIANÇAS”.



quarta-feira, 31 de maio de 2017

Crônicas


CRÔNICAS DO CIBERPAJÉ EDGAR FRANCO 01

A Obsolescência Programada e o Colapso Global

            Ultimamente nosso país está vivendo um momento político conturbado e seguimos ansiosos para retomarmos o desenvolvimento e o crescimento econômico. Na verdade esse é um erro grave, pois as perspectivas de um futuro apocalíptico para a espécie humana que têm engendrado cosmogonias religiosas e inspirado centenas de escritores de ficção científica a criarem obtusas visões distópicas da decadência e extinção da humanidade, parecem ter, nas duas décadas recentes, migrado dos cultos e das ficções midiáticas para os livros, artigos e pesquisas de eminentes cientistas, tecnólogos, políticos e jornalistas. Dentre as vozes que denunciam, há mais de 30 anos, a tragédia anunciada de um colapso global resultante da ação predatória desvairada do homem na biosfera teresstre destaca-se o notório cientista com formação em química, medicina e biofísica, James Lovelock.
            Atualmente pesquisador independente, Lovelock obteve seu Ph.D. em medicina em 1948 no London School of Hygiene and Tropical Medicine. Posteriormente foi pesquisador na Universidade de Yale, no Baylor University College of Medicine, e na Harvard University. É também o inventor de vários instrumentos científicos utilizados pela NASA para análise de atmosferas extraterrestres e superfície de planetas. Suas investigações o fizeram postular a chamada “Teoria de Gaia”, segundo a qual a biosfera terrestre constitui-se de um sistema totalmente interdependente, onde todas as espécies vivas contribuem sinergicamente para o seu equilíbrio e subsistência. Em décadas recentes Lovelock tem escrito livros que apresentam sua visão do colapso global iminente a partir de seus estudos que comprovam que as calotas polares estão em acelerado processo de derretimento devido ao aquecimento global causado pela ação humana. As consequências disso são escassez de água, aumento dos desastres naturais e uma ameaça à vida e à biodiversidade planetária. Em seu livro “Gaia: Alerta Final”, Lovelock  alerta-nos que a ação destrutiva de nossa espécie sobre a biodiversidade, as florestas, os múltiplos biomas, o clima e os oceanos tem se intensificado com a ampliação gradativa dos implementos tecnológicos, quase sempre ligados a interesses de grupos que visam apenas lucrar, sem o mínimo de preocupação com o planeta e a vida.
            Em anos recentes, iniciativas pífias de grandes multinacionais e de governos, baseadas em puro marketing para aplacar o temor das massas, começaram a pregar a diminuição do consumo de água e energia dos cidadãos, mas em nenhum momento falaram da diminuição do crescimento econômico, mesmo utilizando a falácia de um “desenvolvimento sustentável”, continuaram a investir macissamente em uma aceleração do consumo baseada na obsolecência programada dos produtos, criados com a durabilidade programada para serem substituídos incessantemente sem que seja avaliado o alto custo de sua produção para a biosfera terrestre.
            Para a sua produção, os bens de consumo demandam insumos cada vez maiores, quantidades descomunais de água e combustível são necessários, e o seu descarte  é rápido, fruto da crescente "obsolescência programada". Um bom exemplo é a incessante substituição de aparelhos de celular que ainda possuem todas as funções dos anteriores, mas não possuem o mesmo valor de status quo para os seus usuários. O Brasil tem alimentado esse sistema torpe com insumos diversos, bom exemplo são as grandes extenções de terra desmatadas na região do bioma Cerrado - a ponto de pesquisadores considerá-los extinto - para o plantio da cana de açucar visando a produção do biodiesel – um combustível erroneamente considerado ecológico e sustentável.
            A devastação ambiental do bioma Cerrado, na região Centroeste do Brasil, alia o desmatamento de latifúndios inteiros para a produção de cana de açucar visando a usinagem de biodiesel, com a destruição de grandes áreas para a criação de gado - que além de serem um dos maiores causadores do efeito estufa também contaminam manancias de água - assim como as extensas áreas de plantio da soja transgênica sempre aliada a agrotóxicos que destroem toda a fauna e flora local. A experiência de conviver diariamente com o descarte de produtos por razões de obsolescência de qualidade e de desejabilidade, aliada à tristeza de assistir constantemente a devastação do Cerrado, com as plantações de cana, de soja transgênica e as pastagens de gado tomando cada vez mais os espaços ao redor das áreas em que vivo deixa-me assustado com a iminência real de um apocalipse global, uma sexta extinção massiva de espécies, incluindo a nossa. Parece que não é só o nosso rio Tijuco que vai secar de novo.

Edgar Franco é Ciberpajé, artista transmídia, pós-doutor em artes pela UnB, doutor em artes pela USP, mestre em multimeios pela Unicamp e professor do Programa de Doutorado em Arte e Cultura Visual da UFG. Acadêmico da ALAMI, possui obras premiadas nacionalmente nas áreas de arte e tecnologia e histórias em quadrinhos. ciberpaje@gmail.com

/////////////////////////////////////////////// 

Pescaria

Whisner Fraga é escritor. ALAMI

Helena se senta ao meu lado, abriga a pequena mão em minha perna e me pede para segurar o caniço. Entrego a vara a ela, que, depressa, gira o molinete e recolhe a linha.
- Por que você está fazendo isso?
- Senti uma fisgada.
Então Helename pede para lançar novamente o anzol ao lago. Arremesso e devolvo a ela o equipamento. Mal a isca chega ao fundo e a menina traz toda a linha à terra.
- Pai, tá demorando pra pegar um peixe.
- Tem de ter paciência. Tem de deixar o anzol na água. Esperar.
- Por quê?
- Porque leva tempo mesmo. O peixe precisa encontrar a salsicha e depois precisa querer comer.
- Mas, pai, ele não vai sofrer quando for fisgado?
- Vai sim. Um pouco.
- Que dó, né?
- É sim.
O sol está abatido neste início de maio e os peixes foram para as entranhas das águas. Troco a chumbada por uma mais pesada.
Uma fisgada nos cala. Pego a vara e dou um tranco para trás. O bicho se debate na ponta. Solto a linha, deixo que corra.
E ele foge.
Helena me olha, contente, vitoriosa.
Nos ajeitamos no barranco.
- Pai, tá demorando para beliscar.
- Tem de ter paciência. O bom de pescar é o silêncio, é que ficamos pensando.
- Pensando em quê?
- Em tudo.
- Tudo o quê?
- O que quisermos.
- A escola, por exemplo?
- Por exemplo. Em tudo.
- O almoço?
- Também.
- A tarefa que tenho de fazer?
- Isso.
- O peixe que vamos pegar?
- É.
- Mas, pai, tá demorando para beliscar.
  ////////////////////////////////////////////////////////

O Brado retumbante
Martha Marquez de Andrade


Como está representado o nosso símbolo no Brasil de hoje?
O nosso maior orgulho nacional, aquele que representa a nossa nação, está bem representado para a maioria de nós, brasileiros?
Diz nosso Hino da Bandeira: “Salve lindo pendão da esperança, salve símbolo Augusto da paz”, e ainda: “Pavilhão da justiça e do amor”. Analisando sob este prisma, onde está nossa esperança nossa paz, a justiça e o amor?
Conseguiu-se o “penhor de uma igualdade com braço forte?” Onde está a consciência de nação? “Deitada eternamente em berço esplêndido?”
Como estão nossas conquistas hoje?
Onde está o “sonho intenso, o raio vívido de amor e de esperança que a terra desce?” Temos em nosso seio “mais amores?” “Do universo entre as nações, resplandece a do Brasil?”
“Liberdade”!“Abra as asas sobre nós”.
Senhor traga de volta a nossa consciência a fim de reconquistarmos “Nossa Pátria” onde “o lábaro se ostentará novamente estrelado”. Que possamos abrir nossos olhos para enxergar um mundo onde o lema seja o amor e que, nossas mãos, possam hastear nossa bandeira sem “temor servil”. Que ao desejarmos “a paz com fervor”, isto não nos traga dor.
Que possamos ter orgulho de bradar por justiça, de saber amar e, com a alma adorar “a terra onde se nasce”. E vislumbrar à nossa frente, “o Brasil gigante pela própria natureza, belo, impávido colosso”, onde, no “futuro espelha essa grandeza”.
E bradar: “Terra adorada, entre outras mil, és tu, Brasil, ó Pátria amada”.
Com amor febril,
Assinado: “Filhos deste solo”.
Marta Marquez de Andrade é escritora, autora de “Palco de lutas”